
segunda-feira, 5 de abril de 2010
Dieese: país manteve nível salarial em 2009, apesar da crise
O Brasil conseguiu manter a massa salarial e o nível do emprego ao longo da crise financeira de 2009, em relação a 2008. A avaliação foi feita pelo coordenador regional do Departamento Intersindical de Estatística e Estudo (Dieese), Renato Lima.
“No cômputo geral, mesmo com o impacto da crise, a economia interna, dos próprios brasileiros, por meio da circulação de mercadoria e salários, diluiu o impacto maior provocado pela crise – o que não aconteceu nos outros países. Nesses países, que optaram pela continuação da política neoliberal de estrangulamento do crédito, os mercados internos não conseguiram dar pujança e obter resposta.”
As declaração do coordenador regional do Dieese foram dadas à Agência Brasil em reunião realizada esta semana, no Rio de Janeiro, durante a 4ª Jornada Nacional de Debates, a Redução da Jornada de Trabalho e as Perspectivas para 2010.
O encontro reuniu centrais sindicais de todo o país. A ideia era fazer um balanço e uma avaliação mais precisa sobre as negociações do acordo coletivo em 2009, em relação às metas pré-fixadas e às projeções do emprego e da renda para 2010.
“O debate vem demonstrando - através de uma série de estudos estatísticos, qualitativos e quantitativos - que no ano passado nós tivemos, diferentemente dos anos anteriores, um ano com características recessivas dado o impacto que teve, também aqui no Brasil, a crise financeira internacional – especificamente no setor industrial. A conclusão é que, mesmo com a crise, o movimento sindical conseguiu manter os níveis salariais e o nível de crescimento do emprego – uma vez que a queda foi muito pequena e ainda assim localizada.”
“Por outro lado, o movimento sindical brigou muito pela valorização do salário mínimo e isto repercutiu em toda a cadeia da economia, pois mesmo as categorias que não o recebem [o salário mínimo] tiveram seus rendimentos valorizados e puxados para cima”.
Para Lima, programas de transferência de renda do governo federal, como o Bolsa Família, também ajudaram na manutenção da demanda do mercado interno.
“O equilíbrio foi dado pelo aumento do consumo interno, que, incentivado pelos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e pela retirada de impostos de alguns produtos, ajudou o país e o trabalhador a ultrapassar este período turbulento da economia mundial.”
domingo, 4 de abril de 2010
Agricultura familiar sustenta 30 milhões no campo
A agricultura familiar é responsável pelo sustento dos 30 milhões de brasileiros que vivem em ocupações rurais. No entanto, há, entre eles, um baixo nível de educação e a remuneração média é menor do que o salário mínimo. Boa parte (75%) do contingente de trabalhadores não remunerados é composta por mulheres.
De acordo com a pesquisa, 43% da população rural não é remunerada. “A população rural é estimada em 30 milhões de habitantes. Isso corresponde a pouco mais de 16% da população brasileira. É maior do que a população de muitos países do mundo, mas que, por uma falha histórica do Estado, acaba ficando sem qualquer tipo de vínculo trabalhista, direitos e garantias sociais ou qualquer acesso a bens e serviços”, explica a coordenadora de área de Desenvolvimento Rural do Ipea, Brancolina Ferreira.
A baixa qualidade da educação prejudica sensivelmente a qualidade de vida da população rural e o desempenho da agricultura familiar como um todo, “tanto em termos de produção, acesso e uso de novas tecnologias, como por não dar a eles conhecimentos sobre como reivindicar o que precisam”, avalia a pesquisadora.
As mulheres, segundo a pesquisadora, constituem um grande contingente (75%) dos trabalhadores não remunerados que fazem parte da população economicamente ativa. “São mais de 4 milhões de mulheres e pouco mais de 2 milhões de homens nessa situação”, informou Brancolina.
Segundo ela, a alta concentração de terras no Brasil é um dos causadores dos problemas vividos pela população rural. “Os dados deixam claro que a terra continua concentrada nas mãos de poucos, e que as formas de acesso a ela são ainda provisórias e precárias”, disse a pesquisadora.
Datafolha serve de alerta para Dilma.
A pesquisa Datafolha deste final de semana animou a deprimida oposição de direita. Os caciques demo-tucanos, que andavam cabisbaixos, soltaram rojões e agora se agitam para o lançamento da candidatura de José Serra, em 10 de abril. A mídia “privada” também ficou empolgada. O Jornal Nacional da TV Globo, que escondeu a divulgação das pesquisas desfavoráveis ao seu candidato, deu destaque aos “nove pontos de vantagem de José Serra” no Datafolha. A famíglia Frias, dona do instituto tucano e do jornal tucano Folha, também caprichou na divulgação dos resultados.
Espera-se que este bombardeio não desnorteie certos apoiadores de Dilma Rousseff, sempre tão influenciáveis pela mídia e que costumam amarelar nas horas decisivas, passando rapidamente da euforia à depressão. Em certo sentido, a pesquisa tem, pelo menos, dois méritos e serve de alerta aos que apóiam a continuidade do ciclo político aberto pelo governo Lula. Caso ela seja fajuta, como muitos garantem, comprova-se que a campanha será das mais sujas. Caso não, ela confirma que a batalha será das mais duras e exigirá muita combatividade e habilidade política.
As suspeitas de manipulação
A suspeita de que a pesquisa Datafolha tenha sido manipulada tem sólidos motivos. Afinal, este instituto não é confiável. Ele pertence à famíglia Frias, que nunca escondeu seu ódio de classe ao governo Lula e sempre apostou no tucano José Serra, um assíduo freqüentador da sede da Folha. As pesquisas são uma poderosa arma política; não são neutras nem Brasil nem no mundo. Elas interferem na opinião pública, ajudam a costurar alianças e a obter apoios – inclusive financeiro. “A margem de erro da pesquisa é a margem de lucro” dos institutos, dizia Ulysses Guimarães.
No caso desta última, as suspeitas são ainda maiores. Para o sociólogo Emir Sader, a pesquisa foi feita sob encomenda, após outras pesquisas apontarem o crescimento da petista e a estagnação do tucano. “A FSP (Força Serra Presidente) se apressou em fazer a nova pesquisa, que nem esperou a tradicional divulgação de domingo, saindo no sábado. Sem que nenhum fato político pudesse explicar, fizeram o que se imaginaria que um adepto da campanha serrista faria: levantar o ânimo depressivo da campanha opositora, tentando evitar o anticlímax do lançamento de José Serra”.
Disputa sem limites éticos
No mesmo rumo, o blogueiro Eduardo Guimarães lança suspeita sobre “a pressa e o sigilo” desta sondagem. Para ele, o Datafolha é mentiroso. “Estamos falando de um instituto de pesquisas que pertence à Folha de S.Paulo, aquele jornal que não hesitou em publicar, em sua primeira página, falsificação grosseira de ficha policial da grande adversária de Serra”. A pesquisa seria bastante oportuna para o grão-tucano. “Esses números serão usados para ajudar a fechar apoios políticos à sua candidatura e a soterrar resistências dentro do seu partido e entre seus aliados externos”.
Difícil de comprovação, a possibilidade de que pesquisas sejam manipuladas só indica que não haverá limites éticos na disputa presidencial. No convescote do Instituto Millenium, realizado no início de março, os barões da mídia deixaram explícito, através de seus jagunços de aluguel, que farão de tudo para derrotar Dilma Rousseff – como registrou o sítio Carta Maior. Na sequência, a revista Veja já produziu duas capas furiosas contra o partido da atual ministra. O tiroteio não se refletiu nas pesquisas subseqüentes, mas agora o Datafolha ressuscita as esperanças do tucano.
Muitos interesses em jogo
No caso da pesquisa registrar uma nova arrancada de José Serra, mesmo que não existam fatos políticos que expliquem a reversão das tendências e o surpreendente crescimento do candidato da oposição neoliberal-conservadora, ela somente confirmaria o que já era bem previsível: a batalha sucessória será duríssima, disputada palmo a palmo. Ela não será um passeio, com a fácil vitória de Dilma Rousseff já no primeiro turno. Há muitos interesses em jogo nas eleições de outubro.
O império estadunidense não está contente com os rumos da política externa brasileira – contra o golpe em Honduras, em defesa da soberania cubana, em retaliação as medidas protecionistas dos EUA, de relação com o Irã. Já a direita nativa não tolera o Plano Nacional de Direitos Humanos, deseja criminalizar o MST e os movimentos grevistas, rejeita as conferências de comunicação e cultura. A mídia privada, como o partido do capital na atualidade, reflete esta furiosa oposição.
Não subestimar a oposição de direita
A oposição de direita tem base social, principalmente nas regiões Sul e Sudeste; conta com fartos recursos; goza de poder político e econômico; e controla os meios de comunicação. Ela não pode ser subestimada. Uma derrota em outubro aceleraria o seu definhamento institucional – os demos podem sumir do mapa político, juntos com os trânsfugas do PPS, e os tucanos ficariam isolados. Para este bloco político-social, a sucessão de 2010 é decisiva, representa o tudo ou nada!
As condições hoje são mais favoráveis às forças que apóiam o governo Lula – apesar do suspiro dado pelo Datafolha. Mas a vitória dependerá de vários fatores. Exigirá um programa que não se limite à mera continuidade, mas que aponte para novos avanços, com as reformas estruturais que o país necessita. Demandará habilidade nas alianças, atraindo setores de centro e neutralizando potenciais adversários. Dependerá de uma campanha de militância ativa. Estas e outras razões reforçam a urgência de uma maior aproximação de Dilma Rousseff com os movimentos sociais, que poderão jogar um papel mais protagonista na batalha eleitoral deste ano.
Altamiro Borges.
sábado, 3 de abril de 2010
A decadência da imprensa brasileira
Setores da imprensa tiveram também um papel positivo, na campanha das diretas, quando outros tentavam esconder a amplitude do movimento e seu verdadeiro significado.
Assistimos hoje à decadência generalizada dessa mesma imprensa, que martela, cotidianamente, praticamente de forma total e monótona, ataques contra o governo Lula, logrando, no entanto, que apenas 5% da população rejeite o governo, enquanto mais de 80% o apóie. Nunca a imprensa brasileira esteve tão distante e contraposta à opinião do povo brasileiro. Daí seu isolamento e decadência, pelo menos sob sua forma atual.
As organizações Globo, que só possuiam um jornal, sem nenhuma importância, no Rio, antes do golpe, tiveram na ditadura sua grande alavanca, mas, ao mesmo tempo, o golpe insuperável de falta de credibilidade. Ficaram com a marca da ditadura, por mais que tentassem se reciclar, importando colunistas, usando a audiência da televisão para tentar conseguir mais público.
Atualmente dispõe de um trio que atenta contra qualquer credibilidade, que dá a tônica do jornal: Merval Pereira, Ali Kamel e Miriam Leitão. Todos os três se caracterizam por serem as vozes do dono, por sua postura propagandística, sem nenhum interesse no que dizem, nem brilho ou criatividade no que escrevem. São funcionários burocráticos da empresa, que exercem, da maneira que conseguem, seu burocrático papel de opositres, buscando catar supostas fraquezas do governo, que é seu único objetivo.
Nenhum tipo de análise, nenhuma nuance, nenhuma idéia. Para um jornal que precisaría desesperadamente de credibilidade, eles são um tiro no pé, uma confirmação da falta de credibilidade do jornal. O resto do jornal – das manchetes de primeira página às colunas de notícias – padece desse freio da rígida linha editorial, fazendo um jornal sem graça, sem interesse, sem repercussão.
No Rio de Janeiro, o conjunto dos órgãos da empresa, mesmo atuando fortemente a favor de algum candidato, perdem sempre. Lula ganhou nas duas últimas eleições no Rio; os Garotinhos, Sergio Cabral, Paes, mesmo Cesar Maia, se elegeram sem o apoio do jornal, que os atacava. Hoje, contra a vontade majoritária da grande maioria dos brasileiros, ficam de novo, acintosamente, na contramão da opinião do povo e do país, incluído claramente o povo do Rio de Janeiro, que sabe separar programas de diversão que lhe gosta ver, das inverdades que diz o jornal e os noticiários de rádio e televisão da Globo.
Diminuem sua tiragem, perdem público abertamente para a internet, para os jornais gratuitos, para os jornais populares vendidos. Melancolicamente, se arrasta o jornal, na fúria antilulista, sem repercussão política alguma.
O Estadão sempre foi o jornal conservador por excelência, com certa discrição, boa cobertura internacional, posições claramente direitistas. Conforme foi perdendo público para a FSP, que aparecia mais atraente para os jovens, mais ligada à oposicao à ditadura, tratou de rejuvenescer. Como jornal mais organicamente ligado às entidades empresariais, tem uma avaliação mais equilibrada da política econômica, valorizando seus avanços, no marco das críticas tradicionais do liberalismo dos “gastos excessivos do Estado”.
Além do papel do Estado na economia, suas maiores preocupações e críticas ao governo são na política internacional. Sua predileção, em tudo e por tudo, com os EUA, fica ferida com as alianças com os países do Sul do mundo e com os da América Latina em particular. A política externa soberana do Brasil os incomoda profundamente, transformando-se num dos temas mais usuais e violentos dos editorais.
O outro são os movimentos sociais, em particular o MST, que causa ojeriza ao Estadão, pela defesa intransigente do direito à propriedade privada, pilar do sistema capitalista. (O jornal foi praticamente o órgão oficial das passeatas de preparação do golpe de 64, na defesa da “liberdade, da família e da propriedade”, valores aos quais continua fiel.) A liberdade, que inclui centralmente a de “imprensa” (privada, diga-se), protagonizada pela SIP – Sociedade Interamericana de Prensa -, órgão da Guerra Fria, cenário a que o jornal, rançoso, ainda se sente apegado. Os editoriais, sempre, e atualmente Dora Kramer, são os momentos mais patéticos do jornal, saudoso da Guerra Fria.
A FSP é o jornal que mais teve oscilações de imagem. Era um jornal sem nenhum peso até o golpe e mesmo durante boa parte da ditadura militar. O Estadão era o grande jornal de São Paulo. A FSP apoiou ativamente a preparação do golpe militar, sua realização e a instauração da ditadura, cumpriu tudo o que a ditadura determinava, com noticiários que escondiam os sequestros, desaparecimentos, execuções, publicando as versões oficiais, emprestando carros da empresa para a Oban.
Foi ao longo dos anos 80, quando levou Claudio Abramo do Estadão, que a FSP, pela primeira vez, ganhou prestígio, buscando espaço próprio na oposição liberal à ditadura. Pretendeu ser o órgão da “sociedade civil” contra o “Estado autoritário”, conforme a ideología hegemônica na oposição, advinda da teoria do autoritarismo de FHC. (A FSP tirava, todo ano, uma foto no teto do seu prédio na Barão de Limeira, com os que ela consderava os representantes da “sociedade civil”, de empresários a líderes sindicais, como que para expresar físicamente esse vínculo organizado com os setores que se opunham, em graus distintos, à ditadura.)
Consolidou essa imagen emprestando suas páginas para uma certo pluralismo, com um cronista semanal – Florestan Fernandes, Marilena Chaui, entre os mais conhecidos – do PT, e distintos políticos, intelectuais e líderes sociais escrevendo na sua página de opinião.
Desde a eleição de FHC, entrou em decadência, perdendo totalmente a credibilidade que o diferenciava. Colunistas com vínculos pessoais com os tucanos, como Clovis Rossi, Eliane Catanhede, outros, decadentes, como Jânio de Freitas, se arrastam melancolicamente na decadência geral do jornal, o que mais despencou na tiragem e o que mais se transformou nas duas últimas décadas. O filho do Frias pai conduz o jornal pelo abismo da intranscendência e do rancor, se parecendo cada vez mais com a Tribuna da Imprensa da época de Carlos Lacerda.
A Veja se assume, grotescamente, como o Diario Oficial da extrema direita, com paquidermes como colunistas, sensacionlismo de capa, projetando-se como má espécie de bushismo brasileiro. Com dificuldade para conciliar sua imagem de revista de generalidades com esse papel de brucutu da imprensa nacional, foi perdendo aceleradamente tiragem, o que aumenta a crise financeira que levou a empresa a pendurar-se em capitais externos.
Poderia ser menos afetada pela crise generalizada da imprensa, por ser uma revista semanal. Mas a brutalidade da sua orientação política a fez incorporar-se de cheio nessa queda. Terá papel ainda mais truculento na campanha eleitoral, jogando tudo para tentar barra a vitória do governo, esperando-se os golpes mais sujos da campanha da empresa dos Civita.
No conjunto, o cenário da imprensa brasileira – com a única exceção da Carta Capital, entre as publicações diárias e semanais – é deprimente e decadente. Uma vitória de Dilma – que os apavora, seria ficar mais quatro ou oito anos nessa posição de dirigentes opositores -, trará dilemas difíceis para essas empresas. É possível que uma ou outra busque reciclar-se para adaptar-se a novos tempos, em que inclusive tem que contar com o fim de toda uma geração de políticos estreitamente associados a ela, como FHC, Serra, Jereissatti, etc. Isso, associado a uma intensificação da crise econômica das empresas, deve colocar dilemas cruciais para órgãos que assumiram atitudes suicidas, contra a vontade expressa da maioria do povo brasileiro e pagam preço caro por isso.
Emir Sader
Discurso da ministra Dilma Rousseff ao deixar o governo para disputar as eleições de outubro próximo.

Começo saudando a minha querida Erenice Guerra, ministra-chefe da Casa Civil, o ministro Paulo Sérgio, dos Transportes, o Gabas, querido Gabas da Previdência Social, Vagner Rossi, da Agricultura, o Marcio Zimmermann, de Minas e Energia, o José Artur Filardis, das Comunicações, a Isabela, do Meio Ambiente, o João Santana, da Integração, a nossa querida Márcia, do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, e queria saudar os ministros que ficam. Ao saudá-los, saúdo o Guido Mantega, o Fernando Haddad, o Jobim, o Padilha, o Miguel Jorge, Paulo Bernardo, nosso querido Sérgio Rezende, o Barretinho e meu querido Orlando Silva, além do ministro da Justiça, nosso querido Luiz Paulo. Saúdo todos os ministros. Creio ter saudado a todos, pelo menos aqui à primeira vista.
Queria dizer para vocês que fiz um imenso esforço para falar de improviso, mas se eu falar de improviso, presidente, vai acontecer uma coisa, ou duas: uma parte eu vou esquecer. Na outra parte eu vou chorar muito. Então, vou seguir um roteiro, pode ser que continue esquecendo e chorando, mas pelo menos tenho um roteiro em que vou me segurar.
É sem dúvida, presidente, um momento de grande emoção. Acho que para todos os meus colegas aqui que estão saindo e que deixam hoje o ministério do senhor. Mais do que colegas, hoje nós podemos dizer que somos companheiros de uma jornada, de uma missão, de um trabalho que fizemos em equipe. Vivemos uma emoção que alguns poetas disseram que era uma emoção especial, uma espécie de alegria melancólica ou uma alegria triste.
Alegria porque saímos de um governo que consideramos um dos governos que mais fez pelo povo deste país. E tristeza porque abandonamos hoje esse que foi um dos trabalhos, para muitos aqui, há sete anos e meio, e para outros mais de três, mais de quatro anos. De qualquer jeito, tristes porque estamos de partida. Mas se o nosso coração, presidente, sente essa estranha alegria triste, o senhor pode ter certeza que a alma da gente está cheia de otimismo, esperança e de fé. O senhor deu a cada um de nós o privilégio de participar de um dos momentos mais decisivos da história do nosso país. O momento em que o povo se reencontrou consigo mesmo, sob a liderança de um dos líderes mais populares, e talvez o mais brasileiro de todos os líderes desse país.
Ao seu lado, presidente, nós participamos de um processo que nos últimos sete anos e meio fez a mudança mais profunda, a mudança mais importante que as gerações brasileiras que convivem com o nosso tempo histórico experimentaram. Ao seu lado, presidente, a minha geração e a geração dos que me seguem, ou que me sucedem, melhor dizendo, conseguiram realizar seus sonhos. Sonhos que começam na luta de resistência à ditadura, que passam pela redemocratização, por todas as lutas e as dos movimentos sociais por direitos, dignidade, soberania, justiça e liberdade nesse país.
O governo do senhor é um momento muito importante porque é o ápice, um momento de vitória, talvez o mais longo momento de vitória que todos esses que lutaram experimentaram ao longo de suas vidas. Sim, presidente, com o senhor nós vencemos. E vamos vencendo a cada dia. Vencemos a miséria, a pobreza, ou parte da miséria e da grande pobreza desse país. Vencemos a submissão, vencemos a estagnação, vencemos o pessimismo, vencemos o conformismo e vencemos a indignidade. Talvez nós tenhamos vencido, inclusive, esse pesado resquício da escravidão que este país carrega, ou que carregou tão forte. E aí está o ministro da Integração Racial, e ele sabe do que eu estou falando, porque nesse processo nós continuamos vencendo mais de 400 anos de peso e de exclusão que pesa e que oprime o nosso país. Vencendo, sim, porque o Brasil aprendeu que a melhor forma de crescer é distribuir. Que a melhor forma de desenvolver é fazer com que todos participem dos frutos do desenvolvimento.
O senhor trouxe o desenvolvimento com inclusão, fez do social e do econômico duas faces da mesma moeda. Vencemos porque o seu governo mostrou que um país só pode ser soberano se o seu povo tiver condições de sonhar, condições de realizar seus sonhos, e condições de viver com dignidade a sua vida. E que esse povo possa expressar sem medo, sem peias, todas as suas opiniões e seus ideais. Nós convivemos com a diferença, presidente. Vencemos porque seu governo mostrou que o verdadeiro desenvolvimento é filho da democracia e irmão da liberdade, num país que viveu por muito tempo sob regime de exceção.
Vencemos, presidente, e nesse processo aprendemos muita coisa com o senhor, com esse encontro que o senhor, o mais autêntico dos líderes populares desse país, propiciou que nós tivéssemos com o povo brasileiro. E o povo brasileiro, ele sempre nos ensina a ser forte, mas no governo nós aprendemos também a ser persistentes. Com a alegria do nosso povo, nós aprendemos muito. Com o senhor, nós aprendemos que temos que ser otimistas. Nós aprendemos também com o nosso povo que temos que ter resistência, e com o senhor nós aprendemos que temos que ser corajosos.
Por tudo isso podemos dizer que, em apenas sete anos e meio, o nosso governo mudou o Brasil. Quando a gente olha e lembra do que se pensava em nosso país em 2002, nós nos damos conta do longo caminho percorrido. Nós temos orgulho de ter tirado quase 30 milhões [de pessoas] de uma situação de pobreza para as classes médias; de tirarmos mais de 20 milhões da pobreza; de termos empregado com carteira assinada quase 12 milhões de brasileiros. Nos lembramos dos projetos sociais do nosso governo, do Bolsa Família, do ProUni, do Luz para Todos, do Mais Alimentos, da agricultura familiar, do PAC Habitação, da urbanização de favelas, do pré-sal. Cada um desses programas traz em si uma certeza, a de que a vida de milhões de brasileiros está mudando.
Nós sabemos que aqueles que lamentam, os viúvos do Brasil que crescia pouco, da estagnação, fingem ignorar que essa mudança é uma mudança substancial. Têm medo. Eles não sabem o que oferecer a um povo que hoje é orgulhoso e tem certeza que sua vida mudou, não aceita mais migalhas, parcelas ou projetos inacabados. No nosso governo, o povo não é coadjuvante, ele é o centro das nossas atenções e é o protagonista de sua própria história.
Esses programas inovadores que nós criamos, como as Upas, o Brasil Sorridente, as Farmácias Populares, elas surgem dessa convicção de que um país só pode ser grande se for grande também o seu povo. O Fundeb, que multiplicou o fundo da educação básica por mais de dez, em termos de recursos, é um orgulho que nós temos também porque o próximo período vai ser o período das oportunidades.
Também, presidente, nós que amamos o nosso planeta, que temos consciência da importância do Brasil na questão da mudança do clima, estamos orgulhosos por termos reduzido a emissão de gases de efeito estufa no Brasil nos últimos períodos. Aliás, na Amazônia, o desmatamento foi reduzido como nunca depois que se começou a fazer a medição nos últimos 22 anos. A presença do Brasil em Copenhague nos orgulha a todos. Mas presidente, nós aprendemos uma coisa com o senhor que, por trás de cada obra, edifício, de cada projeto de infraestrutura, de cada uma das nossas ações, estavam pessoas, suas vidas privadas e seus dramas.
Recentemente, eu lembro do menino de lábio leporino que estava nas costas do seu tio, lá no Rio de Janeiro, e que está sendo agora operado no SUS. E que mostra à humanidade a importância dos centros de tratamento de fissura no palato que está sendo implantado no Brasil, como é o caso daquele implantado na Ubra, em Porto Alegre. A dona Eliane que procurou a gente na integração do São Francisco e contou para o senhor que vinha da roça e começou a vender quentinhas para os trabalhadores do trecho em Floresta, em Pernambuco. Ela disse para o senhor que agora tinha aberto um restaurante e, com muito orgulho, pagava R$ 5 mil de Imposto de Renda. Por trás de cada obra tem uma história desse tipo.
Como a mãe que confessou para o senhor, no Luz para todos, que ela nunca tinha visto seu filho dormir de noite. Nunca tinha podido ver seu filho dormindo, por isso apagava e acendia a luz para enxergar o filho que dormia e para provar que a vida dela estava mudando. A surpresa imensa daquele senhor alto, um pouco mais velho, negro de cabelos brancos que lá em Minas Gerais atendeu à porta que alguém batia, e a surpresa dele ao ver o presidente da República, um homem alto e careca, parecendo o Kojak, e eu. Ele olhou para o presidente que perguntava para ele se podia entrar, conversar e olhar se a obra estava de acordo com o que o presidente acha que tem que ser a dignidade de uma casa popular. A imensa surpresa dele ao olhar o presidente da República vendo seu banheiro e sua cozinha. Ao olhar se era necessário ter muro na casa e ao dizer sistematicamente, baixo para mim, no meu ouvido: “eu não fui eleito para fazer moquifo para o povo brasileiro. Eu fui eleito para dar dignidade”.
Presidente, eu assisti também ao Cristiano, o senhor lembra do Cristiano? Aquele menino que, vimos nos jornais, nadava na enxurrada. E que o senhor... A gente tinha ido lançar e dar a ordem de serviço para uma parte da recuperação de Manguinhos. Lá o senhor pediu para procurarem o menino. E o Cristiano apareceu magrinho, dizendo que gostava muito de piscina, mas nunca tinha nadado numa. E um ano depois, presidente, nós vimos o Cristiano quase um atleta, nadando no parque esportivo e na piscina do parque que nós construímos ali em Manguinhos.
O Cláudio que nós vimos recentemente, já há uma semana, na Vila Vicentino, na inauguração da casa que nós fizemos. Ele dizia que mais do que obra de cimento e tijolo, aquela obra tinha dado a ele e a sua comunidade dignidade. Sem sombra de dúvida, o presidente nos ensinou a olhar para os mais marginalizados.
Se o presidente convive com líderes mundiais, discute problemas complexos da crise econômica, a questão relativa à crise financeira do mundo, os problemas dessa crise mundial; se discute toda a questão de infraestrutura do nosso país, o problema do desenvolvimento produtivo, ele nunca abandonou esses desvalidos, os catadores de papel. Os hansenianos, os portadores de deficiências... A importância que o senhor deu aos cegos e aos seus cães-guias, não só em termos de recebê-los aqui no Palácio - aliás, ali em frente ao Palácio - mas também todas as ações de afirmação, cidadania e dignidade que o governo sempre reconheceu a eles. Por isso, presidente, eu repito: o povo brasileiro nos ensinou a acreditar no futuro. Mas, com o senhor, nós, juntos, aprendemos a construí-lo.
Por isso, presidente, deixamos o governo - e tenho certeza que falo em nome de cada um dos ministros que estão aqui hoje que saem do governo - renovando nossos compromissos com as bandeiras que abraçamos. E com o juramento que fizemos de cada vez mais lutar e melhorar a vida do nosso povo. Essa tarefa, presidente, ficou mais fácil depois dos caminhos abertos pelo governo, traçados sob a sua liderança.
Nós nos despedimos, mas não somos aqueles que estão dizendo adeus, somos aqueles que estamos dizendo até breve. Nós não vamos nos dispersar. Nós, cada um dos ministros aqui presentes, temos um legado a defender, onde quer que estejamos, exercendo a militância que tivermos que exercer. Sob a sua inspiração, presidente, quem fez tanto está pronto para fazer muito mais e melhor. Estamos simplesmente dizendo até breve. Hoje sabemos que o Brasil é um país pronto para dar um novo passo de prosperidade, de desenvolvimento econômico e social, trilhando rotas já abertas, explorando novas riquezas, como o pré-sal. Sempre buscando gerar milhões de novos empregos.
No seu governo criamos uma base sólida. Com ela, nós podemos erradicar a miséria e nos tornar a 5ª economia do mundo dentro de alguns anos. É mais do que a minha geração podia sonhar. Não que a minha geração não sonhasse alto, mas é mais do que ela podia sonhar olhando para as possibilidades reais sob as quais nós vivemos.
Mais uma vez eu repito, presidente, o senhor nos deu, pela primeira vez, aquele gosto de vitória, não da vitória fácil, mas da vitória que se tem só depois de muito suor, muito esforço e muita dificuldade. É a crença também no diálogo que nós aprendemos. O senhor sempre dialoga. É a crença no acordo. É a crença na democracia.
Como o senhor sempre disse, e sempre eu gostei muito dessa síntese que o senhor faz, a democracia não é a consolidação do silêncio, mas a manifestação de múltiplas vozes. É por tudo isso que nós podemos dizer em alto e bom som: nós nos orgulhamos de ter participado do seu governo. Eu falo por todos os ministros, os que saem e os que estão entrando e os que estão ficando.
Não importa agora perguntar porque alguns não têm orgulho dos governos de que participaram. Eles devem ter seus motivos. Mas nós podemos sempre saber que temos patrimônio, nós fizemos parte da era Lula. Vamos carregar essa história e contá-la para os nossos netos. Vamos carregar essa história e nos orgulhar disso em nossa biografia.
Querido presidente, o senhor também é uma pessoa alegre, afetiva, com senso de humor, que mostra que acima de tudo a gente pode enfrentar os revezes, as dificuldades. Na hora que a coisa endurece, como dizem os jovens, o bicho pega. Mas, nós temos que ter coragem e alegria de enfrentar a vida, a política e achar sempre as soluções. Eu tive o privilégio de conviver com o senhor, de privar dos momentos duros e dos momentos de vitórias e conquistas. Ser honrada por sua confiança. E quero dizer que eu como os outros ministros saímos maiores e melhores do que entramos.
Nós participamos da mudança do Brasil, mas nós também mudamos e é por isso que afirmo: cada um de nós sai uma pessoa melhor do que entrou. Isso, presidente, em qualquer experiência de vida é inestimável. É por isso que eu disse que a gente tem uma tristeza alegre, ou uma alegria triste, porque saímos felizes e revigorados. Pessoas melhores são necessariamente pessoas felizes. O Brasil para nós deixou de ser aquele país em que o futuro nunca chegava. É o futuro que chegou e nós chegamos junto. Isso não tem preço, presidente. É isso que sempre vai fazer de nós orgulhosos dessa experiência. Vai fazer de cada um de nós aqueles que sabem, também, que agora trata-se de ampliar esse futuro que chegou no presente.
Para finalizar, presidente, eu gostaria de agradecer também a todos aqueles que nos ajudaram a realizar essa travessia e que eu vejo aqui presentes. A base aliada, os movimentos sociais, os empresários, os trabalhadores que acreditaram que era possível construir o novo Brasil. Em meu nome e em nome de todos os ministros que participaram e participam desse processo, só tenho a dizer: obrigado, presidente Lula, pela oportunidade de nos fazer parceiros do maior projeto de transformação econômica e social que esse país viu nas últimas décadas. Obrigado também por permitir esse encontro com o povo brasileiro, que fez o Brasil mais próximo do seu povo. Por provar aquilo que sempre acreditamos, que o nosso povo é um povo extraordinário que só precisava de apoio, oportunidade e atenção para mostrar do que é capaz, para mostrar a sua capacidade, a sua inventividade, a sua criatividade, o seu empreendedorismo. Este é o principal sentimento que nós levamos conosco, o de ter lutado ao lado de um grande líder, em favor de um grande povo. Obrigado, presidente.
Eu queria dizer para o senhor que nós hoje estamos num dia muito especial para cada um de nós. Talvez, ao longo das nossas vidas, um momento decisivo. E tenho certeza que hoje nós aqui presentes, nossas famílias, nossos filhos, os netos e os amigos estão orgulhosos do que fizemos. Por isso, eu cumprimento aqueles ministros que entram. Desejo a eles toda a sorte do mundo, porque é preciso ter sorte, o senhor sempre diz. Ninguém vai querer ministro pé-frio também. Mas eu tenho certeza que espera vocês também, trabalho em dobro, como disse o presidente no dia do lançamento do PAC 2.
Eu agradeço a todos vocês, agradeço aos nossos companheiros ministros com quem nós convivemos. Em nome de cada um agradeço os representantes das equipes dos ministros, os representantes das empresas estatais, como a Petrobras. Agradeço a todos por esse trabalho de equipe que é a marca do governo do presidente Lula.
Obrigada.
Dilma Rousseff
31/03/10